Agora que pesquisadores “descobriram” o câncer da próstata e que a indústria farmacêutica “descobriu” que, cada ano, o número de novos pacientes ultrapassa duzentos e trinta mil somente nos Estados Unidos, há mais interesse e mais investimentos na área. Nada comparável ao investimento massivo feito para controlar o HIV/AIDS mas, mesmo assim, algo a celebrar.
O tratamento de outros cânceres parecia ter um princípio, uma diretriz: após o diagnóstico, se houver uma decisão de tratar o paciente, partia-se com tudo para cima do câncer. Sabemos que cada câncer inclui subtipos, causados por células diferentes e que muitos medicamentos funcionam bem em umas células, mas não em outras. A simultaneidade de tratamentos, muitos dos quais com pesados efeitos colaterais, obedeciam à lógica de que um medicamento de um tipo atacava células deste e daquele tipo, mas não eliminava as demais, que exigiam outro medicamento e assim por diante.
A última vez que verifiquei, havia 25 tipos de células de câncer da próstata; embora várias delas sejam raridades, são muito tipos, constituindo um alvo difícil de eliminar com um medicamento só.
Uma tendência mais recente é a de incluir vários alvos num medicamento só. Um dos mais recentes dessa tendência se chama galeterone. Ele lança um ataque em três frentes contra o câncer da próstata. Como se tornou habitual, ele se concentra nos pacientes que já não respondem ao tratamento (anti)hormonal. Os primeiros testes, com poucos pacientes, deram resultados promissores. Não é cura, mas poderá ajudar muitos pacientes.
Quais foram esses resultados obtidos por esses pesquisadores baseados em Harvard?
- 1. Primeiro, em mais da metade dos pacientes, houve uma redução no PSA de 30% ou mais. Esse resultado é modesto, mas me diz algumas coisas:
- · Muitos pacientes não respondem a esse medicamento, embora um número maior possa vir a responder com seu aperfeiçoamento;
- · Redução do PSA não é cura. Cura pode haver, se chegarmos a níveis não detectáveis do PSA. Para esses pacientes que responderam bem ao medicamento, a grande incógnita é: quanto tempo durarão os benefícios? O tempo conta porque, por se tratar de uma população velha, em duas décadas quase todos morrerão de outras causas.
- 2. Em onze pacientes (entre 49) houve uma redução substancial, de 50% ou mais do PSA. A lógica da avaliação é a mesma: nem todos respondem assim (alguns não respondem) e a duração desses benefícios é uma incógnita porque sua determinação depende de um acompanhando de uma população maior por muitos anos;
3. Em alguns pacientes houve redução dos tumores, que representa uma demonstração mais segura de que o medicamento surte efeito, ainda que não cure.
· Galeterone funciona simultaneamente em três direções: bloqueia receptores de proteínas que respondem à testosterona;
- · Reduz o número de receptores nos tumores e
- · Foca em um enzima que está ligado com os caminhos dos hormônios ligados ao câncer.
Os resultados dessa pesquisa preliminar foram apresentados à American Association for Cancer Research. Outra pesquisa, Fase II, terá mais pacientes e avaliará a eficiência do medicamento, devendo ser começada ainda este ano.
É praxe conduzir um terceiro (e mais caro e demorado) tipo de pesquisa, chamado de FASE III, com um número maior de pacientes e um grupo controle.
Ainda falta bastante até que o medicamento seja aprovado e possa ser vendido, mas, se funcionar, é provável que muitos dos leitores venham a ser beneficiados por ele.
GLÁUCIO SOARES IESP/UERJ